Em meados de 2022, o AVC terá um novo líder de equipa na Europa. A equidade na saúde e o apoio à implementação do Plano de Ação no AVC para a Europa irão permanecer no topo da agenda, diz o presidente eleito da ESO, Professor Peter Kelly, e a inflamação representa uma nova fronteira na prevenção do risco.
O que significa para si a função de presidente da ESO no contexto de uma carreira dedicada à prevenção do AVC, AVC agudo e à recuperação?
É uma grande honra representar e servir a comunidade de AVC na Europa, os meus colegas, profissionais de saúde de AVC na Europa e doentes e respetivas famílias. A ESO é um esforço de equipa forte e o meu papel é servir como líder de equipa. A minha função ao longo dos próximos dois anos será ampliar o excelente trabalho dos meus antecessores, desenvolver adicionalmente os programas existentes e, em última instância, deixar a organização numa posição ainda melhor.
Quais são os principais desafios para o acesso a cuidados de AVC na Europa e o que deve ser estar no topo da agenda para os mitigar?
É importante para os países europeus de rendimento elevado apoiar os países de baixo e médio rendimento na Europa. Tem sido demonstrado que os cuidados de saúde estão dependentes e de forma diretamente proporcional ao rendimento médio, por isso é importante focarmo-nos na equidade na saúde em termos de prevenção e tratamento em países de baixo e médio rendimento.
Três importantes programas da ESO que priorizam e apoiam a nossa missão de equidade são o Plano de Ação no AVC para a Europa (Stroke Action Plan for Europe, SAPE), a Conferência ESO anual, cujo objetivo é educar profissionais de saúde sobre os cuidados de qualidade em hospitais e comunidades, e o programa Diretrizes que visa fornecer diretrizes claras e baseadas em evidências para o tratamento do AVC.
A ESO também apoia as iniciativas de qualidades de cuidados tais como a Iniciativas Angels e RES-Q e encoraja médicos especializados em AVC recém-formados da Europa de Leste a assistir a webinars, cursos de inverno e de verão, e mestrados em Medicina de AVC através dos quais a ESO apoia a melhoria dos níveis educativos e apoia o desenvolvimento do apoio e redes de colegas.
Como neurologista recém-formado no final dos anos 80, o que o motivou a forcar-se nos cuidados de AVC?
Como neurologista em formação, a minha grande motivação foi a necessidade não colmatada dos doentes de AVC. Os cuidados de AVC não estavam bem desenvolvidos na Irlanda nos anos 80 e 90. Havia relativamente poucos especialistas de AVC em neurologia e eu queria contribuir e proporcionar liderança sempre que possível.
No início dos anos 90 fiz formação no Hospital Geral de Massachusetts em Boston, em Harvard e no MIT onde enfrentei um ambiente de cuidados de saúde diferente da Irlanda. Tive a sorte de receber formação num ambiente muito motivador com uma forte tradição de cuidados de AVC e de ter sido influenciado por cientistas clínicos como Karen Furie, Steve Greenberg e pioneiros como C. Miller Fisher e Phil Kistler.
Foi também nessa altura que os ensaios sobre trombólise tinham demonstrados que o AVC podia ser tratado de forma aguda. Antes disso, tinha existido um niilismo terapêutico sobre o que podia ser feito para tratar um AVC. Por isso, tratou-se de levar os valores e o modelo do local onde recebi formação e implementá-los noutro lado.
Qual tem sido o maior avanço recente nos cuidados de AVC?
Nos últimos 10 anos os ensaios sobre trombectomia têm sido absolutamente centrais. Reviram por completo a forma como organizamos e pensamos o tratamento de AVC de emergência. Há muita energia e dinamismo no campo do AVC agudo como resultado direto destes ensaios, com o foco em questões mais recentes sobre, por exemplo, doentes de chegam tarde, pontuações ASPECTS na TC mais baixas e oclusão dos vasos médios.
A previsão do risco tem sido o principal foco de investigação para si. Quais as aprendizagens recentes mais importantes do seu trabalho neste campo?
Embora esteja a exercer como médico que lida com muitos casos de AVC de emergência, a minha investigação na prevenção nos últimos cinco anos tem-se focado no papel da inflamação na placa aterosclerótica e em novas oportunidades terapêuticas para prevenir acontecimentos cardíacos e AVC secundário.
A inflamação é a nova fronteira. O ensaio CANTOS (2017) demonstrou que acrescentar o medicamento anti-inflamatório Canakinumab a medidas de prevenção padrão reduz o risco de episódios vasculares. Este foi um momento de avanço que em anos futuros poderá ser considerado como significativo como o primeiro ensaio com estatinas ou a primeira trombectomia.
Atualmente, o ensaio CONVINCE que está a ser levado a cabo em Dublin com o objetivo de descobrir que o medicamento para a artrite Colchicine pode ser redirecionado da mesma forma que a aspirina para prevenir o AVC recorrente e episódios coronários após AVC não grave. [O Professor Kelly é o diretor deste grande estudo internacional para avaliar o uso de Colchicine para a prevenção da inflamação vascular.]
O Plano de Ação no AVC para a Europa (SAPE) da ESO identifica quatro objetivos a alcançar até 2030. Nove anos após esse objetivo, que progressos observa?
A implementação do SAPE depende em última instância dos sistemas de saúde em cada país. O que a ESO pode fazer é ser uma voz e um líder para mudança. Liderada por Hanne Christensen, a estratégia SAPE da ESO tem sido desenvolver um enquadramento para capacitar, encorajar e apoiar as equipas e campeões locais para formarem novas parcerias para implementar estes objetivos.
O primeiro passo é identificar os campeões locais e apoiá-los na ligação com os respetivos governos e com as organizações de apoio a doentes de AVC nos seus países. Esta tríade de ministério de saúde, profissionais de cuidados de saúde e organizações de doentes forma o nexo em cada país. Uma vez ligados, são apoiados a desenvolver um plano, a implementar o plano, a medir o respetivo sucesso, a compará-lo internacionalmente, a ajustar o plano e a implementá-lo novamente, tendo a ESO e a comissão de orientação do SAPE um papel de apoio abrangente.
A ESO também desenvolveu uma Declaração de intenções que pedimos aos governos que assinem e que os compromete a implementar os aspetos específicos do SAPE. Três governos já assinaram e vários estão em vias de assinar. A equipa do SAPE também desenvolveu uma ferramenta baseada na web para captar métricas nacionais e registar o desempenho agregado de cada país nos principais KPI do SAPE. Os dados serão atualizados anualmente para facilitar as comparações longitudinais bem como geográficas ao longo do tempo.
Existe uma sinergia clara entre este programa e a Iniciativa Angels.
Sim, a Iniciativa Angels é um parceiro excelente do SAPE. Existe uma sinergia e sobreposição com a Iniciativa Angels especificamente nos países de baixo e médio rendimento de forma positiva. A ESO é com muito orgulho parceiro da Iniciativa Angels.